Quem é Tomek? Quais suas origens?
Martins (2016) “ poetizou” os diálogos de Tomek com
Marina. Ela – Marina Tsvetáieva, amante de Bóris Pasternak (ou sua noiva) – o conhece
na França, ambos exilados.
O produto final são belos poemas, onde nossa imaginação
(re) corre ao ambiente opressivo stalinista.
Desse modo, amar Tomek é fácil. E agradável! – sentir um
pouco de solidão é possível. Isso, porém, não recolhe o seu modo de ver – e de
repassar – suas interpretações do seu instante. Veja:
Minhas
diferenças com Tomek
1.
Tomek
é um caga-regras.
Ele
insiste em pôr ordem na minha vida.
Que
eu acorde cedo e faça caminhadas.
Que
eu seja didática como outros artistas.
“O
ar do mar, a luz do céu! É disso que você precisa!”
Como
se fosse escolha minha
viver
atenta ao que se passa
nas
cavernas submarinas.
2.
Tomek
ama a natureza.
Qualquer
casca de arvore
é
uma arca de alegrias.
Eu
não.
A
natureza me deprime.
Ela
é muda exatamente
quando
não devia ser.
Tomek
abre o seu coração
Aqui reinam os bisões.
Durante trezentos ou
quatrocentos anos
pensando somente em
copular e criar seus filhotes
eles se espalham por
planícies e florestas.
Como não conheciam
predadores
(são necessários doze
lobos para acuar um bisão)
estavam afeiçoados demais
ao ar, à água, à pastagem
e se sentiam em casa
naquele pedaço da terra.
Quando chegaram as
carabinas de repetição
entraram em pânico
e a única coisa que lhes
ocorreu fazer
foi cavar o chão com suas
patas e chifres.
Desde então na terra
pisoteada
não cresce uma folha de
grama.
Tomek,
um monólogo
“A esse respeito
precisamos ter uma longa
conversa
para a qual essa nossa
vida de exilados
não tem deixado muito
tempo.
Cada nova encomenda de
trabalho
é bem-vinda, mas também
desgastante
pois nos afasta das
tarefas verdadeiras.
Entretanto, considere os
capitéis.
Eles foram inventados
para fazer a passagem
entre o leve e o pesado
- e a chuva de arabescos
indomáveis
caindo sobre as colunas
que um dia foram gregas
é simplesmente a prova
da força e da beleza
necessárias.
‘Como isso se aplica ao
nosso caso?’
Não tenho resposta.
Na verdade, nada se
aplica a nada.
Faz tempo o mundo se
tornou um pardieiro
de salas desconexas,
cheias de múmias
e objetos de culto em que
você tropeça
sem saber se vai emergir
do outro lado.
A princesa egípcia, por
exemplo.
Não há nada que você
possa fazer por ela
nem ela por você. É
melhor virar as costas
e esquecer as galerias e
museus.
A partir de agora
aonde quer que vá
haverá uma pedra à tua
espera.
Nossa tarefa é entalhar
essa pedra.”
A
última fala de Tomek
Todas as coisas do mundo
carregam consigo uma
ternura selvagem.
O primeiro passo é não
temer o selvagem.
O segundo, remover a
ganga de diamante e
gordura que a linguagem
socou
em cada um de nós.
Agora vem a parte mais
difícil.
É preciso sonhar tudo
de novo.
Fonte: Revista Piauí, nº 117, Junho/2016 - págs. 74/5