segunda-feira, 6 de novembro de 2017

As coisas do coração.

As coisas do coração, quem as irá entender um dia? Quando, de repente, percebo que “ela” tocou em sentimentos que se encontravam adormecidos e quero recuar, percebo também que já não é possível. Ela (que és tu) rompeu, defraudou, despertou, dilacerou, reviveu e me fez olhar mais longe. Mas, e se não posso ir mais além, o que fazer? Como controlar o incontrolável que resiste e entende não haver barreiras?
Mas elas estão aí e me impedem o passo seguinte. Olho e vejo onde deveria chegar, mas sei que não irei chegar. Por isso, resta-me o consolo que encontro no poema que segue (o que não significa que a negação seja verdadeira):

Não te amo

Não te amo, quero-te: o amor vem d alma.
E eu n’alma – tenho calma.
A calma – do jazigo.
Ai! Não te amo, não.

Não te amo, quero-te: o amor é vida.
E a vida – nem sentida
A trago eu já comigo.
Ai! Não te amo, não.

Ai! Não te amo, não; e só te quero
De um querer bruto e fero
Que o sangue me devora,
Não chega ao coração.

Não te amo. És bela; e eu não te amo, ó bela.
Quem ama a aziaga estrela
Que lhe luz na má hora
Da sua perdição?

E quero-te, e não te amo, que é forçado,
De mau feitiço azado
Este indigno furor.
Mas oh! Não te amo, não.

E infame sou, porque te quero, e tanto
Que de mim tenho espanto,
De ti medo e terror. . .
Mas amar! . . . não te amo, não.

ALMEIDA GARRET. Não te amo.
In.__Folhas Caídas. Lisboa: Europa-América, 1999, p. 85



Nenhum comentário:

Postar um comentário

A REFORMA E AS SOLAS

Reforma Protestante – nome dado ao movimento reformista que surgiu no cristianismo em 1517 por meio do monge agostiniano Martinho Lutero. A ...