Papos
- Me disseram...
- Disseram-me.
- Hein?
- O correto é
“disseram-me”. Não “me disseram”.
- Eu falo como eu quero.
E te digo mais... Ou é “digo-te”?
- O que?
- Digo-te que você...
- O “te” e o “você” não
combinam.
- Lhe digo?
- Também não. O que você
ia me dizer?
- Que você está sendo
grosseiro, pedante e chato. E que eu vou te partir a cara. Lhe partir a cara.
Partir a sua cara. Como é que se diz?
- Partir-te a cara.
- Pois é. Parti-la-hei
de, se você não parar de me corrigir. Ou corrigir-me.
- É para o seu bem.
- Dispenso as suas
correções. Vê se me esquece. Falo como bem entender. Mais uma correção e eu...
- O quê?
- O mato
- Que mato?
- Mato-o. Mato-lhe. Mato
você. Matar-lhe-ei-te. Ouviu bem?
- Eu só estava
querendo...
- Pois esqueça-o e
para-te. Pronome no lugar certo é elitismo!
- Se você prefere falar
errado...
- Falo como todo mundo fala. O importante é me entenderem. Ou
entenderem-me?
- No caso... não sei.
- Ah, não sabe? Não o sabes? Sabes-lo não?
- Esquece.
- Não. Como “esquece”? Você prefere falar errado? E o certo é
“esquece” ou “esqueça”? Ilumine-me. Mo diga. Ensines-lo-me, vamos.
- Depende.
- Depende. Perfeito. Não o sabes. Ensinar-me-lo-ias se o
soubesses, mas não sabes-o.
- Está bem, está bem. Desculpe. Fale como quiser.
- Agradeço-lhe a permissão para falar errado que mas dás. Mas
não posso mais dizer-lo-te o que dizer-te-ia.
- Por quê?
- Porque, com todo esse papo,
esqueci-lo.
VERÌSSIMO, Luis Fernando.
Comédias para se ler na escola.
Rio de Janeiro: Objetiva,
2001. p. 65-66
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